quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Novo e Não

Bicho quer sair da toca
pra ver se tinha coisa boa lá fora
coisa boa pra comer,
pros olhos, pra saudade.
Bicho segue o som que o atrai,
bicho cava a trilha de volta ao sol.
Suarento, avista uma nesga de luz
no meio do que crê ser torrões de terra,
se agarra àquele fio como se fosse o último
(e cada filho teu como se fosse o último...).

Encontra, do lado de fora, um caco.
Caco de vidro, de ferro, reflete seu rosto e o sangue em suas mãos
e os torrões de terra nada mais eram que
cacos
restos
pon
ti
a
gu
dos, perfurando seus dedos, ferindo seus olhos,
jorrando o sangue de si, sangue de séculos.



segunda-feira, 19 de novembro de 2012

o cair da ficha
desata o nó que faltava pra explosão da bomba,
ali no cantinho do fundo

e mil facas perfurando sua glote,
um pé sobre as costelas e o esmagamento de uma talvez bigorna

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

contido

cabelos presos - soltam-se
os olhos voam
corre descalça pela grama nua, descarrega o que é preciso,

cai sem rumo e rola pelo trigo em flor, a lua brilha - longe

paz.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012


Na casca era só serenidade. Inspira, expira. Enche o pulmão de paciência, ouvidos não mais escutam, boca não mais fala, olhos não mais vêem.
Outras histórias, outras pessoas, outros mundos já preenchiam todo o espaço disponível. Lotado, overbooking de alvéolos, átrios e ventrículos.
E ainda queriam forçar mais o êmbolo. Comprimir aquilo que já tinha atingido o máximo - estoura, a membrana é frágil e não resiste.


segunda-feira, 22 de outubro de 2012

outro, eu.

medo.
não medo, receio. não quero que os novos ventos tragam distância.
folheando os velhos ditos, surge sempre uma pontada, aquele incômodo que insiste em não dar lugar para um respiro. um só.

é cruel: não permite a vida. a oportunidade escapa por entre os vãos dos dedos. dedo fura-bolo, estraga a festa antes das velas apagarem.

monossilabismo.
o outro.
eu.

no fim, nada mudou -
ciclo.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

soslaio

por quê? por que não pode ser?
o tempo corre e a gente não percebe.
quando sente o ar de novos dias, bate o peso de tudo o que não foi feito.
déspota covarde de si mesma.

medo do que precisa estar por vir - do que precisa se fazer acontecer.
é medo do que não depende só de um -

é a pá, que lenta e inexata cava cada vez mais fundo.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

como criança eufórica que deixa o sorvete ir ao chão
perdeu

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

indecidúvisão

Há sempre uma porta a se atravessar.
Do outro lado, a loucura a novidade o belo o arrepio o horror

Limite claro e tentador e efêmero e escape momentâneo

Nada muito especificado, catalogado ou protocolado
Tarefa minha? Nossa?
Ou não-tarefa?


Ao se cruzar a porta, não há volta
sem pena
sem rabo entre as pernas

Os batentes retratam em relevo em bordado e letras e números
o olhar-pra-trás necessário

"Eu preciso destas palavras. Escrita"1


não sim missing salta cai - a ficha
não mais pertence.



1 - Arthur Bispo do Rosário

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Um, dois, três passos
início da longa
jornada rumo ao incerto.

O início já se fora
há quanto, não
havia meio de ciência.

Apenas pedra, areia
sal pela estrada.
Sombra de um

oásis: miragem.
Dois túneis perdidos
e seus donos

pa
ra
le
los

(To someone. Always lost somewhere here)

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Ciu/sau dadela

Leve-me para outros tempos, outros lugares. De preferência um não demasiadamente ruidoso - uma boa música embalando os passos, vozes escusas ao fundo e porventura uma ou outra gargalhada forçada. Leve-me para onde dê vontade de rir para extirpar os males, leve-me para um contexto mud(ad)o. Já está entrando em reviravolta, mas não quero aguardar o tempo, o ramerrão de sua passagem.
O tempo é como uma senhora idosa atravessando a rua. Se lhe damos a mão, se nos dispomos, ele passa a tempo - mas então já perdemos o momento para olhar em torno e aspirar o ar da paisagem. Se nos poupamos para gozar do universo à nossa frente, ao nosso lado e em nossas costas, nunca saímos do lugar - a Senhora Tempo precisa de ajuda para passar...